Mesmo porque, nem que este sujeito queira, poderia viver sozinho assim.
“Um homem é uma vida cercada de outras por todos os lados.” E isso é irreversível.
Mas, estar só, algumas vezes é irreversivelmente irresistível...
...E acho que toda a estrela sabe disso.
Camila Caringe.
(Camila Caringe, 09.2005)
Pele Azul
E é assim. Não tem mais jeito. O mundo não cresceu, mas a população sim. Estamos mais negros, mais louros, mais gays, mais ricos, mais pobres, mais exclusivistas.
E a humanidade aprendeu a fazer barulho, greve, passeata, protesto.
Alguém nasceu para o capitalismo enquanto outrem morria pelo comunismo.
Aprendemos a arte da divisão. Dividimos tudo. Criamos partidos de direita, esquerda e até de centro. Criamos times, escolas de samba. Resumimos o mundo: tudo o que não é bom, só pode ser mau. E essa nova filosofia foi camufladamente desenvolvida e aprofundada: tudo em que eu não acredito está errado e, se está errado, então é mau.
Nosso sistema imunológico passou a ser nossos conceitos pré-estabelecidos: isso eu não como, isso eu não quero, disso eu não gosto, isso é feio.
Conceito pré formado: pré-conceito. Preconceito!
Simples x complicado.
Serve x não serve.
Ideal x impróprio.
Perfeito x imperfeito.
Verdade x mentira.
Absoluto x relativo.
É claro. A gente já sabe de tudo. É só abrir o jornal que já se ganha o dia. Sabemos de tudo por mais um dia. Até que saia o jornal de amanhã estaremos a salvo.
Algumas pessoas rotulam. Outras se esforçam para que caibam nos rótulos que desejam. Algumas até mesmo se obrigam a caber em rótulos que jamais almejaram.
“Eu sou azul. Mas eu não queria ser visto como azul. Mas este ambiente é inapropriado porque eu sou azul e as pessoas vão me achar muito azul para fazer isso”.
E assim caminha a humanidade. Com passos de formiga e sem coragem. Sem coragem de dizer que tem vontade de fazer aquilo que sempre critica quando o outro faz. Sem coragem de cantar alto, de dançar sem saber como, de falar que não concorda, de aprender o que não sabe, de começar primeiro, de assumir que não acredita, de contar que tem medo.
Estaremos a salvo enquanto o vizinho não souber o que escondemos na garagem. E na garagem escondemos um diário indelével de percepções que fingimos não ter. Escondemos esqueletos no armário. E continuamos a dividir tudo. O dividido sente-se a parte rejeitada, mas continua a dividir-se por si próprio.
Dividir-se, apartar-se, limitar-se, restringir-se, colocar-se, dividir-se.
Por detrás da pele azul existe a consciência de que pouco importa, mas ainda a atitude de quem peca.
Camila Caringe.
03.2006