29 de janeiro de 2014

famille


Até que conheceu um francês que iria. A família toda comemorou. Digo, a casa em Paris. As férias em Angra. Pouco tempo depois, uma desgraça. Conheceu um paulistano naturalizado mineiro que estragaria. 

__ Estou grávida. 

Da primeira vez, a alegria. 

__ Vai se chamar Larra. 
__ Lara? 
__ Larra. É frrancês. 

Apesar de ter negócios lá e deixar esposa e filha muito tempo ociosas, o francês esperava que fosse passageiro. Mas... 

__ Estou grávida. 
__ Grrávida? 
__ Não. Cauê. O pai já escolheu o nome. 
__ Ah. O pai. 

...esperava, sabe? O francês esperava que fosse só uma traição, que ela voltasse. A família toda esperava. Ela, inclusive, se esperava voltar. Até que o mineiro paulistano deu o ultimato. 

__ É o fim da picada! O fim! 

Aí ela decidiu se decidir. 
Ficou com esse segundo. E de vez em quando sai de férias com os filhos para a Europa. Ou pra Angra. 
O francês iria.

21 de janeiro de 2014

H. Leite


Um ser humano entre 0 e 2 anos de idade deve ter entre 75% e 80% do corpitcho formado por água. Mas minha filha não. O mini-corpo dela é 90%. Só que de leite. Descobri isso com observação fenomenológica. Simples: se ela verte leite até pelo nariz e ainda sobra na pancinha para conseguir engordar o dobro da média diária de recém-nascidos, temos que a soma dos quadrados dos catetos é igual à raiz quadrada da hipotenusa, representado pela seguinte função logarítmica, cujo zero é o umbigo:
Logo, 10% de Helena se distribui entre muco, mucosa, órgãos, membros, músculos, ossos e boquinha linda. O resto é o sobrenome que, diria Einstein, não pode ser coincidência. 

14 de janeiro de 2014

Primeiras heranças


__ David Luiz! Eu gosto dele! 

Lembrei daquele gol salvo no jogo contra a Espanha, no final da Copa das Confederações. E dos caracóis dos cabelos dele. São marcantes. 

__ Como se escreve? 
__ Como se escreve, querido? Escreve lá pra moça! 

A gente teve uma menina. Mas, antes, pensou em nomes para uma criança menina, menino, velhinha, velhinho, golfinho, etc. O nome de um jogador não nos havia ocorrido. Só que apareceu, diante da solicitação. 

__ Bilma. 
__ Bilma? 
__ Bilma. 
__ Vilma! 
__ Bilma. – assentiu com o mesmo sorriso. 

Na hora, fiquei pensando em quantas roupas é possível fazer em nove meses. Um monte, acho. Tantas que o filho não foi recebido como um acontecimento. Ela tinha a expressão de fato corriqueiro ao pegar, dar de mamar, responder com dificuldade aos questionamentos e deixar que escolhessem um nome para o seu terceiro filho. Quando o pai chegou e foi chamado a formalizar o nascido vivo é que se deu conta. O casal se entreolhou surpreso, como quem se lembra de algo que nem cogitou. Cochicharam e se fizeram entender no pedido para que a moça dos registros, por favor, dissesse o nome de um jogador do Brasil. Ela balbuciou um “Neymar”, mas se arrependeu rápido e engoliu de volta. Daí pediu ajuda: 

__ Neymar! – falei. 
__ Não... Eu pensei nisso, mas é muito feio... Fala outro, mais bonito... 
__ David Luiz! Eu gosto dele! 

Ficou bonito. David Luiz Numseiquê Gonzalez. Eu me lembro que terminava com Gonzalez, herança da Bolívia. Da gestação, herdou a costura e o anonimato. Dos pais, ganhou dois irmãos bolivianos e os cabelos muito negros. E na recepção, o sorriso materno, frágil, ingênuo, de quem não entende uma palavra em brasileiro.