30 de julho de 2015

A virilidade do homem branco




Fiquei muito brava com a notícia do dentista que matou o leão no Zimbábue. Não conseguia parar de pensar nisso. O cara tem a cara de atravessar o planeta, sair lá do consultório nos EUA pra ir pra África atirar no leão. Quer dizer, né? Não tem mais nada pra fazer. Sente falta da sensação de masculinidade, força e triunfo perdida na vida moderna besta e vai lá com arco, flecha e rifle, caça, degola e escalpela o animal. Não antes de tirar umas fotos bem bonitas pra mostrar pra galera.

Fiquei transtornada ao saber os detalhes.
É o fundo do poço da pobreza de espírito e da vilania. 
Um caso grave de desvio de caráter.
E o pior: eu conheço essa com laranjas.

29 de julho de 2015

Denúncia


Operação Lava Jato investiga a participação de Christiane Pelajo, William Waack e Carlos Alberto Sardenberg no maior escândalo de corrupção da história do universo conhecido. Segundo o ministro da fazenda, Joaquim Levy, a boa vontade contundente do trio na divulgação de cada detalhe com esmero e paciência só pode ser indício de formação de quadrilha, cartel, corrupção ativa, passiva, dedo no bolo e olho no peixe. “Quem deve teme”, disse o ministro rapidamente enquanto saía para dar uma volta de bicicleta com Dilma depois do café da manhã. 

A presidenta aproveitou a oportunidade para reiterar que Gilberto e Caetano também estão na mira. Mas daí retrocedeu adotando termos mais amenos quando se lembrou de que Israel é parceiro comercial do Brasil. “A Polícia Federal tem autonomia. Justiça seja feita.” A diretora da escola infantil brasileira Passinho Inicial comentou com alguns pais sobre a sorte dos alunos em relação às crianças palestinas. “Temos paredes e merenda”, teria dito em off a uma fonte que não quis ser identificada. Eduardo Cunha, presidente da Câmara que ficou de mal do governo recentemente, pediu que a escola seja incluída na CPI dos Fundos de Pensão.


20 de julho de 2015

Fô na cabeceira e outras histórias


__ Consegui fazer a criança comer alface pela primeira vez. Pergunte-me como. 
__ Como? 
__ Coloquei numa cumbuca de metal várias folhas lavadas com azeite e bem pouquinho sal. Daí comecei a comer na frente dela sem oferecer, devorando e delirando de prazer. Ela ficou curiosa e se aproximou. Deixei ela pegar. Ela colocou na boca e cuspiu. Eu fingi que não vi e continuei comendo alucinadamente. Ela insistiu outra vez e cuspiu. Na terceira, começou a me imitar e comeu! 

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A pequenininha não me acorda mais exigindo o teté. Agora mudou. Acho que ficar gritando “mamãe e teté” era meio desgastante. Agora ela simplesmente fica de pé no bercinho e sorrateiramente... acende a luz na minha cara. Muito mais prático! 

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Fomos a uma loja de plantas e compramos uma mini era e uma mini samambaia. Para a mini pessoa que ameaçava tacar os vasos de vidro no chão, o moço deu uma mini flor de brinquedo, que ela adorou. Chegando em casa do passeio, ela estava com sono e coloquei-a no bercinho para descansar. Pedi para guardar a florzinha, mas ela não deixou. Queria ficar segurando. Consenti e saí do quarto. Depois voltei para vê-la dormir e encontrei isto:


19 de julho de 2015

Minha história sem graça


Cheguei na padaria para tomar café da manhã e a moça que me atendeu perguntou se era o de sempre. Eu me senti muito previsível, então pedi o cardápio para dar uma olhada. Ela ficou me esperando decidir e aí eu pedi o de sempre mesmo.

10 de julho de 2015

A origem do mal


Já de longe se me perguntam é de verdade essas coisas que contas e eu de pescoço mole tem hora a cabeça pendendo pra frente resignada respondo sim. 
Eu mesma me surpreendo muita vez e por isso até implico com a ficção. Qual serventia se com essa vida tão rica de absurdos? que chegar em casa com a água a nos receber à porta já é em si de se estranhar. Bati no vizinho do lado só buscando explicação e o que consegui foi mais. A água descia da máquina de lavar do vizinho de cima inundando nós dois de encanamento compartilhado e o Henrique se oferece para me ajudar a não afogar. Tomei providências por ordem de importância. Primeiro evitar que a criança dormisse sobre as águas e jamais acordasse. Vovó esta noite. Depois, um pedidinho para o vizinho de cima. Bati as falanges médias naquela porta: 

__ Quem é?
__ Camila, a vizinha de baixo.
__ Não conheço.
__ Ué, mas pode conhecer. É só abrir a porta. (isso podia ser uma cantada, repara)
__ Não, agora não.
__ Olha, eu preciso falar com você. Estou com um problema. Você poderia abrir a porta por favor?
__ Não. Não quero.
__ Bem, no meu apartamento está vazando a água que está vindo da sua área de serviço. Você poderia por favor desligar a sua máquina de lavar até amanhã, quando o encanador vem?
__ Não. Não quero.
__ Vou ter que falar com o síndico.
__ Faça o que quiser.

Desconcertada com tamanha maturidade contei ao Henrique sobre a conversa riquíssima com o vizinho de cima. Não evitamos rir jogando a água para fora que descia em cascata alagando dois corredores e afetando outros apartamentos. 
Na manhã seguinte ele reconheceu na lembrança do vizinho de cima o sujeito de bem que cruzava no elevador de vez em quando. “Parecia normal.” 
Confessei que quando fui assaltada ou agredida ou assediada ou prejudicada de alguma forma, o fui por sujeitos que podiam ser bastante agradáveis quando ninguém precisava deles. 
É que o mal é banal. E começa com a indiferença. Depois se espalha em cascata, afetando outros apartamentos. 
A mesma oportunidade no entanto revelou o lado bom. À direita da minha porta para quem está de saída e precisa de solidariedade. Lá se encontra generosidade. Em português e inglês. 

2 de julho de 2015

A gente se esforça demais

É o que eu fui reparando, a tensão do que é certo censurando o importante. Nisso eu pensei naquela tarde de festa junina na fazenda, quando ouvi a voz das crianças atrás de mim. Entrei com a minha filha no colo na casinha de pau a pique de cuja entrada pendia a plaquinha indicando “casa de pau a pique”. O fogão à lenha, a mesa de madeira, uma pequena máquina de costura e um segundo cômodo com uma cama de colchão de palha. Janelas e porta eram apenas seu contorno sem paradas. E o telhado. 

Enquanto eu posicionava a pequenininha para fazer a foto, uma outra mãe entrou com suas duas crianças um pouco mais velhas. As crianças pareciam encantadas, mas a mãe estava entediada, olhou ao redor e abandonou a casa. Coloquei a bebê de pé nos joelhos para que ela alcançasse a vista e ouvi às minhas costas enquanto as crianças deitavam na cama e se cobriam com a palha muito entusiasmadas. O menino disse para a menina: 

__ Queria que a minha casa fosse assim. Não. Queria morar aqui. Queria morar em um lugar como esse. Ou… pelo menos ter um lugar como esse pertinho, para eu ir sempre que eu quiser. Eu queria poder vir aqui todos os dias e ficar aqui. 

Para ler o texto na íntegra e ver a foto, clique aqui e visite a página do Blog Inverso.