7 de abril de 2011

Assassinato por escrito

Ela levou a mão ao coldre pela segunda vez em três meses completos. Depois de todas as tentativas anteriores, só aquelas contavam. Era o segundo segundo em que o mirava, o momento em que ele era alvo silencioso de toda fúria vociferante que o amor assinava. Ela própria era seu alvo junto dele, a bala, o gatilho e ela. Tudo uma coisa só.

...E levou a mão ao coldre, sacou sua arma e o mirou diante de si, aquele alvo silencioso à mercê de toda a culpa. Ele era o abismo, a morte que ela queria matar.

“Bang!” – o dedo se apertou no tiro certeiro que o atingiu de raspão no dedo mindinho do pé esquerdo. Ela tinha vontade de torturar para matar. Torturar.

“Bang!” – e fez vento no cabelo.

Ele se ajeitou, célebre como indefeso, bebendo dela a razão de – “Bang!” – o furo na parede.
Naquele rosto doce ela via círculos em duas cores ao redor do pequeno ponto, bem no centro de sua visão turva.

“Bang!”
“Bang!”

Ela avançava na direção de seu alvo e queria perfurar-lhe a carne, estar em suas entranhas, apagar sua memória, história e existência. Queria ser a própria bala para vê-lo dentro, testemunhá-lo o sangue e a ferida. Curá-lo.

“Bang!”

Mas era a palavra sua munição e sua intenção um sacrilégio.

“...O amor que despertas em mim é todo teu e só teu, porque de outro só poderia ser se aquele fosse tu. Ainda depois de ti será teu o que houver, será teu o que for, serei tua. Diante de ti, vestida estarei nua, eterna espera à beira do mesmo precipício: o que leva o nome teu.”

Ela levou a mão ao coldre pela segunda vez em três meses e atirou nele todas as palavras que aquele amor enfurecia e inspirava.

“Bang!” – e o extinguiu...

O matara para a morte ao se confessar e o guardara. Dentro dela ele para sempre viveria. E agora sabia.

“Bang-bang!”

9 comentários:

Anônimo disse...

Quando o meu bem-querer me vir
Estou certa que há de vir atrás
Há de me seguir por todos
Todos, todos, todos o umbrais

E quando o seu bem-querer mentir
Que não vai haver adeus jamais
Há de responder com juras
Juras, juras, juras imorais

E quando o meu bem-querer sentir
Que o amor é coisa tão fugaz
Há de me abraçar com a garra
A garra, a garra, a garra dos mortais

E quando o seu bem-querer pedir
Pra você ficar um pouco mais
Há que me afagar com a calma
A calma, a calma, a calma dos casais

E quando o meu bem-querer ouvir
O meu coração bater demais
Há de me rasgar com a fúria
A fúria, a fúria, a fúria dos animais

E quando o seu bem-querer dormir
Tome conta que ele sonhe em paz
Como alguém que lhe apagasse a luz
Vedasse a porta e abrisse o gás

Joey Marrie disse...

Hoje acordei pensando uma coisa, uma frase, que sei lá de onde surgiu, não parava de me atormentar o pensamento...

"A nossa crueldade já nos basta."

Como num ato masoquista estavam os dois ali, prontos para matar algo dentro de si, prontos para matar suas vontades para o mundo e matar também um pouco um no outro. Ferir o outro era então atingir a si próprio e de que precisavam aqueles dois, trancados num quarto à espera dessa coisa misteriosa que nao veio, nem saberão se virá?
Castigo ou redenção?
Havia um estranho carinho pairando sobre um e outro e, quanto mais afastavam-se mutuamente, fosse talvez o momento em que estavam mais próximos...

Una disse...

NAO SABEMOS DO QUE IRA VIR A FRENTE OU SURGIR AMANHA NEM O QUE IRA ACONTECER COM NOS HOJE......ACORDAMOS SAIMOS, NAO SABEMOS SE VOLTAMOS....

Lino Xongas disse...

Confesso que tenho saudades de Bang-Bang..., mas daqueles que eu assistia com meu pai nas noites de sábado na extinta TV Tupi. Matança, naquela época, tinha um doce sabor de ingenuidade. Matança, hoje, é amarga e assusta.

Amanda Proetti disse...

Vc é doida, né?! Dizem q td gênio é...

Una disse...

o que torna cruel a matança somos nos mesmos...

Anônimo disse...

li o seu blog queria deixar um que tb gostei http://marcoaureliosa.blogspot.com/

Alex Demian disse...

sei como é..
foi uns 5 bangs mas acho que eles acertaram..
foi a pior dor que eu ja senti, a que não sangra vermelho.
é transparente, salgada.

o bang veio com um "não quero te ver nunca mais"
o segundo foi com um "tb não nos falaremos"
o terceiro com "sabia que ia dar errado"
o quarto "não acredito em vc"
o quinto...
o quinto foi pra ligar a memória dela com o sangue transparente, salgado, que escorre dos olhos quando doem.

Magno Nunes disse...

Realgengo, Rio de Janeiro - 2011!