Eu não sei como tanta sujeira cabe numa pessoa. Parece que o preto se vai acumulando como que a formar um duplo do indivíduo, um outro dele mesmo que o encobre, como pêlos ou penas, talvez a lhe aquecer.
Desgrudar aquilo tudo exigiria um arranque doloroso, uma festa de despedida. Um braço forte, força párea que lhe urdisse novamente o ventre e a tez, fundida em negrume, já quase extinta. Nem feição mais, tal ponto. Debaixo de um banho se revelaria, descoberta, quiçá, que depois de um tempo até a gente se esquece da gente. Se não nos chamam pelo nome, decerto o esquecemos. Se não usamos da dignidade, não a temos.
Eu imaginava ali correntes e escutava grilhões nas passadas. Mas eram só dois pés sujos metidos em tênis velhos, silenciosos. No topo do ser sem nome, cabelo vasto e o fumo lhe fazendo contorno.
Dó, não... Era outro espécime em mim nascendo, outra manifestação quase tão ruim. A solidariedade que se tem por bicho. Um reconhecimento entre animais.
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3 comentários:
Eita...
Ok ok... vou ali pegar um sabão de coco! feia!
Pode ser algumas coisas...
Aquele menino sujo que brincou dia todo e vai pra casa... não quer tomar banho e perder todo "divertimento" e tudo que passou, quer continuar sujo, fazendo parte daquilo mesmo não fazendo mais.
Ou seria uma segurança, criar uma crosta de sujeira que te impede ter mais sujeira.
Ao menos aquela ali já sua, criada aos poucos, sujeiro particular, intima eu diria.
Morremos velhos enterrados na terra suja e nossa alma é limpa.. quase transparente?
Limpa-se um corpo de terra com agua..
Limpa-se uma alma transparente.. com???
(Voce melhora cada vez mais nessa coisa toda de escrever)
E tem uma canção que diz...
"Todo o mundo é uma pessoa engraçada
E todo o mundo tem a alma emaranhada
Todo mundo tem uma infância que ressoa
No fundo de um bolso esquecido
Todo mundo tem restos de sonhos
E cantos de vida devastados
Todo mundo procurou alguma coisa um dia
Mas todo mundo não a encontrou"
E aí vamos pintando o rosto e o corpo, como se fossemos pra guerra. Na verdade é uma guerra e nós, soldados que somos, escondidos muitas vezes atrás de trincheiras, muitas vezes rastejando por valas, nos apegamos à sujeira como que pra esquecermos nossa condição humana... ou seria o contrário?
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