22 de maio de 2011

Criança é besta

Não canso de me lembrar de quantas vezes fui ludibriada, enganada, torturada ou feita de boba por esse mundo mau quando eu era pequena. Hoje em dia isso ainda acontece, mas por razões maiores, mais nobres, como amor, dinheiro e as tortinhas de limão da mãe do Rakal. Só que quando eu tinha nove anos, não havia tanto discernimento no meu pouco juízo e eu me vendia por pouco:

_ Mas mãããe... Ele é feito pras crianças que não podem ter bichos em casa! Não faz sujeira, não faz barulho! Deixa, vai, mãe! Nem é tão caro...

A maravilha dos anos noventa. Depois da agenda eletrônica da Cassio, que fazia caricaturas e tinha controle remoto universal, nada era mais ultra-moderno do que o bichinho virtual. Depois dele, ficar mudando os canais da TV da vovó sem ela notar nem tinha mais tanta graça.

Eu poderia postar aqui, para vosso deleite, uma foto minha vestida de freira, segurando um crucifixo do tamanho do meu próprio tronco, com cara de poucos amigos e uma genuflexão forçada pela professora-freira atrás da câmera que me desferiu o golpe do flash, maculando minha integridade para todo o sempre.

Mas não.

Basta dizer que aquela primeira comunhão foi atormentada pelo amor de mãe. A minha ainda alertou, antes de eu sair de casa:

_ D'aquí! Deixa seu bichinho virtual comigo! Eu cuido enquanto você estiver lá!
_ Não precisa, mãe! Eu cuido! Deixa!
_ Não vai ficar mexendo nisso lá, hein?!
_ Não, não...

Pois amarrei meu bichinho naquela espécie de ceroula por baixo do hábito e lá fomos nós. Bichinho, calcinha, roupinha de freira, terço e eu, no carro do papai. Durante a cerimônia... “Ai meu Deeeuuusss... E se o bichinho estiver com fome? E se estiver com sede? E se estiver com calor? E se eu tiver que dar uma injeção? E se ele morrer enquanto eu estou aqui???”

_ Tia! Preciso ir no banheiro... He...
_ Venha.

E lá ia a chatinha comigo, até o banheiro. Eu tinha só o espaço da casinha para me mover, arrancar o bichinho do meio daquela roupa toda, alimentá-lo, colocá-lo pra estudar, dar água, recolocá-lo entre as saias, dar descarga para disfarçar e sair do banheiro com cara de alívio por nada. Isso repetido umas cinco vezes durante toda a comunhão. Afinal, era só apertar o botão, mas eu não queria que ele morresse. Amor de mãe, sabe?

7 comentários:

Anônimo disse...

Terrivelmente linda desde sempre.

Anônimo disse...

Terrivelmente encantadora.

Anelise Belusso disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anelise Belusso disse...

Sou fãaaa!

Espero que não se importe que essa curiosa caloura no mundo do blogspot, invada seu espaço. Me deliciei na forma como vossa senhoria se expressa, me paixonei com a "mimosidade" dos seus textos. E ah... o meu tomagoche morreu afogado. Adivinha? Isso mesmo, caiu no vaso sanitário.

Magno Nunes disse...

Eeeeeeeeee eu tinha vários...
tive um que virava um touro, ou pelo menos parecia...

Será que era o demo? O_o

Hoje ainda vende ali na 24 de maio... Acho que vou comprar um...

Mas falando em pais, eu lembro que o meu falou uma vez:

"Essa nota de 5 vale mais que essa de 10..."

Daí eu virei pra ele, com meu ar de sabedoria e disse:

"Tá bom pai, senta lá..."

Fim

Anônimo disse...

O bichinho virtual pra elas era o Pokemon pra eles?

Joey Marrie disse...

Quanto zelo e carinho!!!
Ô, bichinho sortudo esse viu? rsrs

E acho que a foto da pequena freirinha só abrilhantaria este post.

bjo bjo bjo