Ah... fui chegando lá na praça lá de cima onde fica a banca das fruta, que sempre fica coisa pra jogar fora deles, né?, e eu pego no cesto. Tava noite e tava frio. Eu tava bem segurando esse aqui, né?, sempre, que tem minhas coisa. É poucas coisa, mas é minhas coisinha que eu levo... Daí parei na esquina, embaixo daqueles relógio que mostra temperatura. Mexi ali no cestinho que tinha ali no... na... na frente dos banquinho ali, né?, verdinho. Mexi tudo, tal, num tinha nada não. Só tinha uns menino mais pra lá assim, né?, que eles fica conversando às veiz que eu passo vejo gente lá, ali falando, que a banquinha faz suco... faz... essas coisa, tem água de côco, tem... essas coisa, fruta. Eles faz lá. Eu olhei lá os menino, mas não falei nada não, né?, que não conheço. Só vi assim, mais assim sozinha pro lado, uma moça sentada sozinha. Sozinha a menina, de noite. Mas não parecia assim que nem eu, não. Era mais... tava mais, assim, como eu posso dizer... tava ajeitada, né?, com roupa passada, dava pra ver que ela não... Devia ter casa, né? Acho que ela tinha casa e só parou pra... não sei pra quê. Acho que pra pensar um pouco, que a pessoa tem vontade, às veiz, de pensar, né? Acho que foi isso. Mas olhei a menina e assim no frio ela tremendo mas não tava de blusa, não. E sozinha. E assim... com o olhar perdido, sabe? Olhando pro chão... a cara dela não tava nem triste! Não tava nada! Tava só olhando pro chão, pro lado, assim, pra lá. Mas não tinha jeito de... de nada! De nada, não. Só olhando só. De repente olhou pra mim! Eu pensei “nossa! quê será que ela quer, né?” porque ela ficou me olhando assim... como se quisesse alguma coisa, sabe? Mas eu não tinha nada também. Dizer que a pessoa quer celular, carteira, essas coisa eu não tenho. Não tinha nada, só o saquinho, mesmo, que é um saco preto e não tinha nada. Tinha... um cobertor, por causa que... o frio... mas só também. Nem lembro se tinha mais coisa. E a menina olhou... e eu olhei... e ela não fez nada. Nem eu. Ela olhou eu também olhei, né? Fiquei olhando. Parecia que ela queria trocar de lugar comigo e eu pensei “eu trocava, se pudesse”. Claro, né?, que a pessoa... Porque alguma coisa, algum lugar ela devia ter, porque tava com a roupa passada! A pessoa que passa a roupa já... como se diz? Tem, né? Alguma coisa... A pessoa ter ferro de passar roupa e passar a roupa... então... tem roupa, tem ferro e pode passar na casa mesmo, né? Então por isso que eu pensei que ela tinha casa. E eu não. Então até trocava de lugar com ela. Senti uma inveja, assim, sabe? Não coisa ruim que as pessoa deseja tanto não... Era uma coisa assim no coração... que eu queria ter alguma coisa também. Não que não tenha, né? Eu tenho aqui no meu saco as coisinha. Mas... um lugar assim eu não tenho, né? E se a menina tinha então já tava na vantage, pensei. E eu não sei porque, mas senti que ela pensou a mesma coisa de mim. Que eu tava na vantage. E eu não sei porque, mas senti isso assim no peito. Só que foi muito rápido. Não parei pra olhar a menina não, que as pessoa não gosta, né?, que fique olhando muito assim, não. Não faz bem ficar assim parado olhando a pessoa. Daí eu segurei minhas coisa e fui embora andando pra lá que essa rua desce aqui, né?, daí vira... e eu fui pra lá. Mas eu fiquei pensando depois que pode ter sido. Que eu não tenho nada, né, e a menina tem. Mas às veiz a pessoa não quer o que tem. Quer uma coisa que não tem ou não quer nada. Pode ser que ela queria ser eu pra não ter nada... ou pra ter outras coisa... Quer dizer... não sei, né? Tô aqui pensando... Mas... bom... isso porque ela não viu que eu tinha dentro do saco. Acho que se visse não ia mais querer ser eu não e ia pra casa colocar uma blusa a menina. Não sei... É essas coisa que a gente fica pensando, né?, que acontece assim... Não sei.