5 de novembro de 2014

Amantes tristes


Uma das vantagens de se lidar com alguém ao longo dos anos. Essa linguagem compartilhada, o gueto, a comuna. Eu entendo o que ele diz quando poderia ter escolhido quaisquer outras palavras. “Pessoas”, “infelizes”, “quem procura o amor”, “frustrados”, “sofridos”. Mas saiu assim, poético, condescendente: “...são amantes tristes”. 

Recorríamos a Freud, Lacan, terapeutas, amigos, nossos pais e ex-casos para exemplificar os vícios da vida, da cafeína à cocaína, dos rituais matinais aos cacos emocionais que não abandonamos. E eu falava da solidão. Prática, para mim a saída é aceitar a solidão. Toda ela. A de se sentar no divã, a de regar as plantas pela manhã, a de conviver com o band-aid no calcanhar, a solidão de viver, de morrer, de babar no travesseiro enquanto dorme. Ele me chamou de insensível, porque não podemos superar tudo sozinhos. Não tudo. E não sozinhos. 

Mas é isso! É isso mesmo. Não sozinhos. Talvez precisássemos do cafuné, do abraço, de alguém pra fazer o chá e trazer o miojo. Mas a sua dor é só sua. A minha dor é só minha. A graça que transtorna o meu rosto talvez não faça o mesmo por você. E se fizer, vai ser diferente na sua bochecha. A pequena pinta no seu ombro que faz de você, você. 

Gentilmente, ele me lembra que toda a demanda é uma demanda de amor. Até quando se dá as costas, quando se grita, quando se compra o que não se precisa, quando se ama e quando não ama. Até quando buscamos o amor lá onde ele não se manifesta. Aqueles que parecem odiar, que abusam, que exploram, os que choram. “...São amantes tristes”.


Um comentário:

Felipe Teles disse...

São, são sim.
E que se tornem felizes, alegres, satisfeitos.
Mas sempre amantes.
De si ou de outro.
Ou outro e não si, sei lá.
Mas amantes por profissão de vida, ou melhor, de alma.
Que seja eterno enquanto dure a procura pelo amor.
E que estejamos todos juntos quando estivermos sozinhos.