O primeiro passo depois da escada rolante é um pequeno passo para um homem, mas um passo ainda menor para a humanidade.
E tanto faz. Não é contrariando seus devaneios ou se levando muito a sério que um homem decide – enfim, decide – entrar por aquela porta iluminada uma vez mais. A versão comercial da Porta da Esperança (ou Porta dos Desesperados?). Uma piadinha interna de mal gôsto que ninguém notou. Riu consigo mesmo a caminho do terceiro piso.
Andava sempre às voltas de um relógio de praça (sem a praça). Uma referência para poder acertar o seu. Menos rigoroso do que um Kant, não sentia a necessidade de ser pontual dia após dia. Mas podia ser que precisasse, daí a importância de se regular a máquina do pulso. Menos ainda adepto da vida sadia (que vida de velhice!), desprezava ar livre e seguia reto até a joalheria.
A qualquer momento do horário comercial, passava, parava, um aceno pras mocinhas, encarava os ponteiros da parede por alguns segundos, acertava os seus e seguia a vida no mesmo ritmo, levando em conta a eternidade. Um dia surpreendeu. Entrou. As vendedoras se entreolharam.
__ Boa tarde – num tom baixo, cortês, muito educado. Todas chocadas. A mais nova, espírito presente, acudiu:
__ Boa tarde.
__ A senhorita se importaria de me dar um cafezinho? – e direcionou o olhar para outra máquina, mais ao fundo, expressa, sem números. A gerente discretamente autorizou.
Após tomar seu pedido, quietinho, de pé mesmo, agradeceu e explicou sua vontade incontida. Foi-se embora para voltar no dia seguinte. Conferiu o relógio de parede, acertou seu pulso e partiu no mesmíssimo ritual.
Um mês depois, acolhido já com menos espanto, voltou a pedir café e foi atendido.
Dias depois, daí sim, confiante, deu seu grande passo:
__ Bom dia.
__ Bom dia.
__ Eu poderia usar seu telefone um instantinho para fazer uma ligação?
Um comentário:
Começa assim... pede a mão e já quer o braço!
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