30 de janeiro de 2015
28 de janeiro de 2015
Primeiro dia
Com o atraso do primeiro, escolhi aleatoriamente um taxista-segunda-opção, quem ganhou mais de uma hora até o aeroporto para reelaborar comigo o processo de separação, segundo casamento e como foi que ele perdeu completamente o contato com a filha Júlia, que hoje está com 12 anos.
Um caso de alienação parental em decorrência de uma separação unilateral. Ele queria cair fora. Ela não.
Quando ele era gerente de um banco, ela se sentia perfeitamente à vontade para, por exemplo, no aniversário, pedir o cartão de crédito dele emprestado para comprar um presente para si mesma. Foi assim que ele pagou em dez suaves parcelas uma bolsa Louis Vuitton de oito mil reais. Mas daí, depois que o Sudameris foi comprado pelo Real que foi comprado pelo Santander, a qualidade da chefia ficou em 5,0 na escala Richter: assédio moral obsceno. Na última reunião o chefe mandou ele tomar no cú. Ele levantou e disse "vai você que cê deve gostar. tô indo embora" e foi. Com os direitos trabalhistas comprou o táxi e o padrão de vida caiu. A mulher não soube compreender.
Depois que se separaram, ela chegou a invadir o prédio da nova namorada. E também bateu no carro dele enquanto ele saía da garagem da casa dos pais. Amassou a lateral do táxi para ele não ir encontrar a namorada e ainda ficar sem meios para trabalhar.
A despeito dos problemas, a nova relação se fortaleceu e ele decidiu se casar novamente. Como último recurso, a ex disse que ele nunca mais veria a filha. E ele nunca mais a viu mesmo.
Ele disse que chegou a procurar seus direitos, mas percebeu que a justiça favorece a mãe em uma separação litigiosa e, fortalecida por uma ou outra mentira, a ex-esposa tem as prioridades da guarda exclusiva e usa de alguns artifícios para inviabilizar o contato paterno.
Ele conta que tenta ligar pra menina toda a semana, mas que parece que a ex-mulher trocou os números de telefone, já que, além de ela não atender, agora respondem pessoas cuja voz ele desconhece.
É um peso que ele carrega no peito, esse desrespeito à paternidade, essa distância da filha.
18 de fevereiro de 2013 foi a última vez que ele a viu, uma segunda-feira. A data ele mesmo mencionou.
Agora planeja ter um outro filho com a atual esposa.
19 de janeiro de 2015
Intolerância laica
Encontrou entre as folhas impressas da pesquisa as
instruções do jacaré.
Sentou com o menino e primeiro separaram todas as peças
amarelas que seriam necessárias. Enquanto isso, ele foi desabafando as
experiências dos quatro anos, a escola, a babá, a irmãzinha e a calopsita da
prima, que tinha uma crista assim alta que ele fazia com gel no cabelo pra
ficar igual.
Na parte dela as peças de Lego eram maiores, porque as
crianças eram menores. Antes de começar o evento ela pesquisou muitas formas
diferentes, imprimiu e organizou em uma pasta, para consultar o repertório e
não decepcionar a infância. Uma coisa de feeling, não que fosse exigência.
O jacaré ia aparecendo na parte do gato da vó que só fazia
cocô no cestinho do crochê...
__ Você não tem respeito mesmo.
__ Oi?
__ Você não tem respeito por mim, nem pelo meu filho, nem pela
nossa religião.
__ ...
__ Se você não tem fé o problema é seu. Mas não desdenhe
assim das famílias de fé.
__ Hum?
__ Vem, filho.
__ Mas mãe... o jacaré...
__ Solta isso. Olha o que você fez, menina. Sua
desrespeitosa. Menina insolente. Vamos filho.
Minha grande torre colorida ia aparecendo na parte em que
ela me explicou o que concluiu mais tarde, conversando com a supervisora do
evento da Lego sobre a situação:
“Não farás para ti imagem de escultura representando o que quer que seja do que existe lá em cima, no céu, ou cá embaixo, na terra, ou nas
águas que estão debaixo da terra.” Deuteronômio, 5:8
9 de janeiro de 2015
Pari normal
Já na trigésima nona semana, ele vaticinou: “a bebê vai entrar em sofrimento fetal. Eu te opero na terça”. Tivesse eu aceitado, a bebê perderia 3 dias de barriga e um parto perfeitamente normal, sob os olhares de uma mamãe suada e lacrimosa e um papai de mão firme, que cortou o cordão umbilical. Teríamos perdido uma à outra, digo. Aquele momento lindo em que estávamos sujas e éramos, pela primeira vez na vida, duas pessoas distintas.
Eu chorei. Ela não. Espertinha, veio pro peito.
O médico do convênio nunca mais teve notícias de nós duas. Não voltei nem pra agradecer pelos meses de consultas meio afobadas e atrasadas. Ingrata.
Nem voltei pra dizer pra ele que, naquele dia, entrei no consultório rindo da piada ótima que fizemos enquanto descíamos a rua. E saí do consultório chorando, com medo de que minha bebê estivesse sofrendo na barriga.
Nem voltei pra dizer pra ele que, depois da última conversa, falei com mais 4 médicos e nenhum deles me disse que a diminuição do líquido amniótico era crítica. Pelo contrário: era o esperado, já que eu estava na última semana de gestação.
Também nem voltei pra dizer que a minha bebê nasceu saudável e que não me anestesiaram pra parir. Foi na raça, caras. E eu não morri. E ainda vou dizer uma coisa aqui pra vocês: sou totalmente a favor do parto normal e fiquei muito feliz de saber que o governo adotará medidas para coibir a cesariana entre pacientes de convênios médicos. Demorou, mas antes tarde do que nunca.
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5 de janeiro de 2015
3 de janeiro de 2015
Terror induzido
Nunca fui fã. Por essas e por outras fui acusada diversas vezes de ser careta.
Não vou ficar aqui listando minhas incontáveis escolhas que não poderiam ser chamadas de “conservadoras”. Vou me ater a um dado essencial em minha defesa: aos oito anos de idade fui flagrada lendo Eu, Christiane F., 13 anos, drogada e prostituída. Deram sumiço na época, li inteiro com mais de 18.
Leitura muito mais nociva e que ninguém se deu conta antes de começar a avançar os sintomas da demência precoce foi Horror em Amityville, aos 12. O livro era escrito em forma de diário pelo padre que acompanhou a decadência espiritual da família assediada por entidades do mais puro e tenebroso mal. Trazia foto do casal, planta da casa, desenhos da caçula de três irmãos que dizia ter um amigo invisível que lhe aparecia em forma de porco.
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