Linda, rosto simétrico, pele lisa, sobrancelha desenhada. Usava um vestido longo verde e um hidjab da mesma cor e do mesmo tom. Comportava-se com graciosidade.
Enquanto eu comia meu bolo da sobremesa ela contava a história de uma marroquina encarcerada. Casada e grávida de dois meses, o marido (ela ainda se refere a ele como marido) a convidou para ir ao Brasil, onde tinha negócios. Ao desembarcarem, foram presos na alfândega. Havia drogas na bagagem. Dela. Só dela.
Ela disse à Polícia Federal que desconhecia a droga, mas o marido alegou categoricamente que era dela.
Ele foi deportado. Ela foi presa aqui.
O bebê nasceu na prisão e ficou com ela todo o tempo. Por meio de advogados especializados nas leis islâmicas e brasileiras, conseguiu alegar inocência e ser libertada.
Acossada pela tradição, não quer voltar ao país de origem. Foi enganada, mas também foi deixada pelo marido e presa por porte de drogas. É uma vergonha. Alguém que passa por isso mancha o nome da família e não deve regressar.
A religião a acolheu. Primeiro na mesquita, onde foi convocado um chá com a elite e a história foi exposta. Criaram uma rede de apoio. Ela recebe abrigo e salário na casa de uma muçulmana que a ajuda a falar português. Tem aulas do idioma e escola pro filho, que está com quase três anos. Nunca mais entrou em contato com ninguém da família nem com o marido.
Marido.
"O Brasil usa e explora a infância. Crianças são usadas para o tráfico. Nos países árabes é a mulher quem está nesse papel. Muitas são enganadas pelo marido que volta impune, pronto a se casar novamente."
Mas, em ambas as culturas, quem explora, quem engana, quem usa?
Um comentário:
Os seres humanos...
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